SEM PROFECIA O POVO SE CORROMPE?
SEM PROFECIA O POVO SE CORROMPE?
“Onde não há profecia, o povo se corrompe…” (Provérbios 29.18)
O termo hebraico traduzido por “profecia” (ḥāzôn) refere-se à revelação divina autêntica, à direção espiritual de Deus dada por meio de Sua Palavra, não a previsões místicas ou revelações individuais. Já o verbo “corrompe” (pāra‘) indica desordem, ausência de domínio, de instrução, uma vida sem direção ética ou espiritual, como um povo à deriva, sem freios morais, vulnerável à anarquia espiritual. O povo se desvia moral e espiritualmente em ausência da direção da Palavra de Deus.
Mas para alguns, esse texto é um coringa retórico, usado para justificar ambientes onde a presença de um “profeta” geralmente entendido como alguém que faz previsões pessoais, “entrega revelações” sobre o CPF, o futuro profissional ou sentimental de alguém é essencial para manter as pessoas “firmes” na fé. Assim, cria-se uma cultura religiosa onde a ausência do “profeta do momento” leva o povo a “esvaziar a igreja”. Isto é uma distorção que substitui a revelação divina pela manipulação emocional. Esse tipo de interpretação errada promove um tipo de cristianismo dependente de espetáculos religiosos, não da maturidade espiritual. As pessoas vão à igreja ouvir uma palavra para sua vida, como se Deus estivesse o tempo todo emitindo boletins individuais por meio de “profetas de ocasião”. Isso enfraquece a centralidade das Escrituras e da ética do Reino de Deus, e substitui a voz de Deus pelo carisma do líder. O Evangelho é rebaixado a uma bolsa de promessas personalizadas, e não a um chamado à cruz, à justiça e ao discipulado.
Na Bíblia, os profetas denunciavam injustiças, convocavam ao arrependimento, confrontavam líderes corruptos e apontavam para a fidelidade à aliança. Atualmente, muitos “profetas” falam do futuro profissional de empresários, mas se calam diante da corrupção, da injustiça ou da manipulação religiosa na própria igreja. Profecia que não confronta estruturas de pecado, mas somente consola a carne com promessas de sucesso, não é voz de Deus, é espetáculo para consumo religioso.
Corrompe-se o povo, não pela falta de profecia, mas pela falsificação dela. Ironia das ironias, o povo não se corrompe porque falta profecia, mas, porque a profecia verdadeira foi trocada por promessas interesseiras e revelações subjetivas.
Esse falso profetismo serve ao ego, ao consumo espiritual e à autoridade incontestável do “profeta ungido”. É um ciclo que gera infantilização espiritual, dependência emocional e cegueira teológica. Não é o silêncio de Deus que destrói a fé do povo, é a mentira dita em nome dEle.
A igreja necessita de menos revelações particulares e mais de formação bíblica sólida, discernimento espiritual maduro e compromisso ético com o Reino de Deus. Profecia que não leva à cruz, não denuncia o pecado estrutural e não revela o caráter de Deus é só espetáculo com nome santo. Como dizia o profeta Jeremias: “Não mandei esses profetas, mas eles foram correndo. Não lhes falei, mas profetizaram.” (Jeremias 23.21)
Sem a direção de Deus por meio de Sua Palavra, o povo se perde; mas quem permanece fiel à Palavra de Deus, encontra a verdadeira felicidade.
— Rafael Assiz
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